Mais de 30 mil pessoas concorreram a uma vaga e você chegou até aqui!" O rosto confiante do pastor Silas Malafaia é capturado pelas câmeras e projetado em tempo real em quatro telões espalhados por uma gigantesca tenda branca montada no centro da cidade de Águas de Lindoia (SP), estância turística localizada a 160 quilômetros da capital paulista. Atrás do discreto púlpito de vidro colocado no meio do palco iluminado por 28 holofotes coloridos, Malafaia prega para milhares de crentes sentados e atentos, numa abafada noite de dezembro. "Eu sei que Deus está falando com as pessoas. Sei que aqui tem corações generosos e discernimento espiritual", profetiza.
A sua semente vai multiplicar
"Eu não te chamei aqui para você pagar a conta. Você é meu convidado", prossegue Malafaia. Mas existe um problema de ordem financeira nessa afirmação: os custos do evento ficaram em R$ 4 milhões. E, até aquele momento, o pastor só havia conseguido arrecadar R$ 1,25 milhão em "ofertas", como ele prefere chamar as doações. Portanto, era preciso levantar o que falta. O staff de Malafaia rapidamente distribui para cada ouvinte um envelope com os seguintes dizeres: "A sua semente vai multiplicar (2 Coríntios 9.6b)". Dentro dele é possível colocar dinheiro ou cheque para 30 dias. Ofertas acima de R$ 100 são facilitadas em até dez vezes no cartão. Malafaia, então, dá a sua cartada mais arrojada e pede que uma dezena de pessoas semeie R$ 100 mil. A alta cifra não produz qualquer expressão de espanto ou desaprovação na plateia. Em seguida, ele convida mil participantes a contribuírem com R$ 1 mil. Malafaia não exige doações. O pastor apenas alerta que, se alguém hesitar em colaborar, "Deus vai fazer outro levantar e a benção que ia para você vai para outro". Logo em seguida, contemporiza: "Se R$ 100 é tudo o que você precisa, é seu sonho, não dê! Se não for, é a sua semente". O raciocínio segue em progressão geométrica até a casa dos milhares de reais. Ele encerra o pedido com uma oração em forma de ditado, repetido em uníssono pela plateia. "A oferta é boa/ a terra é boa/ e haverá/ uma grande colheita".
Uma igreja em cada cidade
Apesar de ser figura carimbada na mídia há décadas, seu "ministério" próprio - a Assembleia de Deus Vitória em Cristo - tem menos de três anos de existência. Nesse pouco tempo já contabiliza 130 igrejas e 40 mil fiéis, a maior parte no estado do Rio de Janeiro. Antes, Malafaia pregava no templo comandado pelo falecido sogro, o pastor José Santos, presidente da Assembléia de Deus da Penha, no Rio de Janeiro. Malafaia era o vice-presidente. Com a morte de Santos, no começo de 2010, ele abriu sua própria congregação. Agora, seu sonho mais ambicioso é abrir uma igreja em cada uma das 5.568 cidades do país, arrebanhando assim milhões e milhões de almas. "Eu acredito que, em dez anos, eu possa ter duas mil igrejas", ele me confidencia durante conversa realizada uma semana após o término do congresso em Águas de Lindóia.
"Eu não tenho uma igreja de babacas"
Malafaia afirma que rege seu ministério pela "lei da semeadura", uma metáfora bíblica para o bom e velho "é dando que se recebe". "E como você semeia na Teologia da Prosperidade? Você semeia ofertando", analisa Figueredo. É difícil saber quando Malafaia está nervoso. Debatedor nato, ele é daqueles que raramente ouvem o que interlocutor está dizendo. Mas sua voz atinge um volume irritado quando questionado sobre as ofertas que chegam até sua igreja, entidade isenta de imposto pela Constituição. "Minha igreja tem desembargador, tem procurador, tem mais de dez caras com doutorado, professores de universidade. Eu não tenho uma igreja de babacas, que tem um malandro lá tomando deles", rebate. "Como é que pode um cara passar 20 anos dando dinheiro? É um imbecil? 20 anos dando dinheiro e não aconteceu nada na vida dele?", questiona.
Pastor fundamentalista
Malafaia jura que jamais vai se candidatar a um cargo eletivo, mas não nega que deseja ver sua igreja influenciando todos os ramos da sociedade, inclusive a política. Seu irmão, Samuel, já é deputado estadual no Rio de Janeiro. Nas últimas eleições municipais, em outubro do ano passado, o pastor apoiou 18 candidatos a vereador em todo o país e só dois perderam. Na capital fluminense, turbinou a campanha de Alexandre Isquierdo (PMDB) - o terceiro mais votado - com R$ 80 mil do próprio bolso e outros R$ 194 mil de sua editora. Malafaia afirma que, nos debates de que participa, jamais apela para dogmas da Bíblia para embasar sua argumentação, mas somente à ciência. Psicólogo de formação, garante que mulheres que abortam têm mais propensão a cometer suicídio e que é o bebê o agente ativo da gravidez, e não a mãe. Ele se opõe ao casamento entre pessoas do mesmo sexo porque "casamento é um homem, uma mulher para preservação da espécie, para procriação". Quando questionado se esse conceito não é estritamente religioso, ele nega com ar de desdém: "É sociológico, é antropológico". Entre seus gurus científicos, cita George Gilder, expoente da extrema-direita do Partido Republicano dos Estados Unidos.
Sua guerra declarada aos ativistas do movimento LGBT mira o projeto de lei 122, que transforma a homofobia - assim como o preconceito por religião ou cor da pele - em crime. Apesar de haver um parágrafo no texto que diz claramente que, nos cultos religiosos, a condenação "pacífica" da homossexualidade é permitida, Malafaia argumenta que o PL é a tentativa de colocar uma mordaça nos cristãos e uma afronta à liberdade de expressão. "Quer dizer que se um cara se beijar (sic) no pátio da minha igreja e eu impedir eu vou pra cadeia? É isso que eles querem? Chegar no pátio da minha igreja para vir me afrontar?", protesta.
"O Malafaia cresce na polêmica", define o pastor batista Valdemar Figueredo. De fato, o pastor mais comentado do país gosta de comprar briga. E sequer se melindra em ser chamado de "fundamentalista". "Fundamentalista? Obrigado. Significa que você é o quê? Superficial? Pelo menos, eu tenho fundamento. Pelo menos, eu tenho uma estrutura para defender minhas ideias. Eu encarno, eu levo na onda", finaliza.
Fonte: GQ Brasil