6 de nov. de 2012

Vitória nos estados indecisos definirá presidente; entenda votação nos EUA.


Flórida, Ohio, Pensilvânia e Colorado são alguns dos estados que recebem maior atenção dos candidatos à presidência dos Estados Unidos às vésperas da eleição do próximo mandatário, nesta terça-feira (6). Nesses estados, a diferença entre o democrata Barack Obama e o republicano Mitt Romney nas pesquisas de intenção de voto é inferior a 5 pontos percentuais, o que configura empate técnico. Em uma eleição indireta, como a americana, a vitória dentro de cada um dos estados é que importa, e o desempenho nessas unidades da federação pode decidir quem será o futuro presidente.

Diferentemente do sistema brasileiro, quando o eleitor americano vota em um candidato ele escolhe, na verdade, um colégio eleitoral dentro de seu estado, composto por delegados, que só então elegerá o presidente. Em todo o país, o colégio eleitoral reúne 538 delegados, de 50 estados e do distrito de Columbia, onde fica a capital Washington.

O censo populacional define a quantos representantes cada estado tem direito – quanto maior a população, maior o número de delegados.

Estados menos populosos têm direito a, no mínimo, três delegados, o que ocorre atualmente em oito deles. As unidades com mais moradores possuem mais representantes. No caso da Califórnia, por exemplo, são 55 delegados. A Flórida tem 29, e o Texas, 38. Para vencer a disputa, o candidato à presidência precisa ter o voto de 270 delegados no país.

A polarização entre apenas dois partidos faz com que existam nos Estados Unidos regiões tradicionalmente democratas e outras republicanas, que não costumam gerar muita dor de cabeça aos candidatos. Nos chamados "swing states", no entanto, o resultado é imprevisível, e a vitória nessas regiões costuma decidir quem ficará na Casa Branca pelos próximos quatro anos.

Na maior parte dos estados, a votação ocorre no modelo chamado "the winner takes it all" (o vencedor leva tudo): o partido do candidato com mais votos populares no estado leva todos os representantes do colégio eleitoral destinados àquele estado para a votação direta. Assim, um candidato que receber 40% dos votos da população em um estado não terá nenhum peso na votação nacional se seu opositor conseguir mais de 50% dos votos.

"Isso faz com que os estados pequenos tenham uma representação maior. Nos estados pequenos, um membro do colégio eleitoral representa 150 mil pessoas. Na Califórnia, cada um representa 600 mil. Por essa distorção, há a possibilidade numérica de um candidato com menos votos da população ser eleito", explica Oliver Stuenkel, professor do núcleo de estudos sobre Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de São Paulo.

Isso ocorreu em 2000, na vitória de George W. Bush. Naquela eleição, o democrata Al Gore teve 48,38% dos votos nacionais, contra 47,87% do republicano. Entretanto, Bush conseguiu 271 delegados, contra 267 de Gore. A diferença foi definida no estado da Flórida, que na época tinha 25 delegados. Bush ganhou de Gore no estado por uma diferença de apenas 537 votos populares, levando todos os 25 representantes do colégio eleitoral e alcançando o mínimo necessário para ser eleito.

Os representantes do colégio eleitoral são eleitos previamente dentro dos partidos. Cada partido precisa nomear o número de representantes exigido em cada estado antes das eleições. Em algumas localidades, eles são obrigados por lei a votar no candidato do partido que representam. Em outros estados, são livres para votar em quem quiserem, mas espera-se que votem no partido que representam. Votos trocados acontecem raramente, e podem levar a disputas judiciais.

Caso nenhum candidato alcance os 270 delegados (o que pode acontecer se um terceiro concorrente conseguir angariar mais votos), a decisão vai para a Câmara dos Deputados, com a delegação de cada estado tendo direito a um voto.

Maine e Nebraska

Apenas dois estados não seguem o modelo "the winner takes it all": Maine e Nebraska. Nesses locais, a votação é dividida por distritos eleitorais. O candidato mais votado em todo o estado leva dois delegados, e a vitória em cada distrito dá direito a um. Os dois, entretanto, possuem um peso pequeno – Nebraska tem cinco delegados, e Maine possui quatro.

Os dois estados também possuem uma tendência bem clara em seus votos – no Nebraska, os republicanos costumam ganhar, enquanto no Maine a população tende a preferir os democratas.


Descentralização

O sistema tem origem na fundação dos Estados Unidos, quando ainda havia estados com escravos. "O colégio eleitoral leva em conta o fato de que os estados existiam antes do país. Em muitas maneiras, ele não é democrático, mas quando a Constituição foi escrita não havia comandantes eleitos por voto popular em nenhum lugar do mundo, não havia nenhum modelo de democracia", explica Sandy Maisel, titular da cadeira William R. Kenan Jr. do Departamento de Governo de Colby College e especialista em partidos políticos e eleições nos EUA.

O colégio eleitoral também é consequência direta da descentralização do poder federal. Cada estado tem o poder de aprovar leis diferentes em diversos setores, e nas eleições os estados também possuem um peso muito importante. "Como os EUA são um país bastante descentralizado, a importância da eleição presidencial não é tão grande. Os estados conseguem modificar leis sobre educação, pena de morte, uma série de impostos. Isso é decidido nas capitais dos estados. O governo federal é visto tradicionalmente como um invasor, que quer centralizar o poder", explica Stuenkel.

Essa descentralização também dá mais poder aos estados pequenos – tanto no momento da eleição quanto durante os mandatos presidenciais. "Os estados pequenos tem um interesse importante de manter o sistema atual, eles conseguem atenção não só na eleição, mas no processo de orçamento, acabam recebendo mais fundos", diz o professor.

Voto não é obrigatório

Um ponto-chave das eleições para presidente dos Estados Unidos é o fato de que o voto não é obrigatório.

Diferentemente do que acontece no Brasil, a população vota por vontade própria. Com isso, a campanha adquire contornos diferentes, com maior interação entre os candidatos e o público. A eleição ocorre em um dia útil – a primeira terça-feira depois da primeira segunda-feira de novembro.

As taxas de comparecimento são baixas. "A taxa em 2008 foi a mais alta desde 1956, cerca de 64% dos habilitados a votar compareceram. Em 2004, foi de 60%, e em 2000, de 54%. Tem aumentado, mas mesmo assim mais de um terço das pessoas ainda não votam", explica Stuenkel.

Por isso, os partidos investem em técnicas para incentivar o comparecimento às urnas, principalmente nos estados indecisos. "Eles possuem estruturas profissionais, os partidos vão em todas as ruas e tocam em todas as portas para assegurar que as pessoas irão votar. Eles oferecem serviços para levar as pessoas, transporte", afirma o professor.
A idade para votar e a maneira de validar o voto mudam de estado para estado, em mais um reflexo da descentralização política dos Estados Unidos. Na maioria dos estados, a idade mínima é 18 anos. Cada região também tem leis específicas sobre a permissão de votos para presos, se o voto pode ser feito antecipadamente, se é necessário fazer um cadastro anterior ao voto (como no Brasil, onde é preciso estar registrado na Justiça Eleitoral e possuir um título de eleitor válido) e que tipo de documentos são necessários para votar.

Obama e sua mulher, Michelle, por exemplo, votaram antecipadamente, como permite a lei do estado de Illinois -ele em pessoa, ela pelo correio. Em todos os estados, também é possível votar em casa, com uma célula recebida pelo correio e enviada de volta também via postal.

Em vários estados, é possível se registrar para votar na hora, uma mudança relativamente recente que beneficia a população mais simples. "Tradicionalmente, a porcentagem de pessoas que votavam entre os mais pobres era muito baixa. A população negra não votava, tinha que fazer um teste de leitura, havia várias maneiras de reduzir a participação desses grupos. Depois surgiram leis para facilitar o acesso", explica Stuenkel.

"A grande maioria dos americanos não tem passaporte e nunca carrega identificação com foto no dia a dia. Uma inovação recente é a possibilidade de votar com a carteira de motorista, isso aumentou a participação", completa o professor.

Essas diferenças levam a algumas confusões, que podem ser exploradas por defensores de um ou outro partido. Recentemente, eleitores da Flórida, da Virgínia e de Indiana receberam ligações informando que poderiam votar pelo telefone, o que não é permitido. Quem acreditar deixaria de votar no dia da eleição, beneficiando um dos candidatos.

Em Ohio e Wisconsin, foram instalados outdoors em bairros pobres que mostravam uma pessoa atrás das grades, alertando sobre as penas em caso de fraude eleitoral. A imagem, entretanto, pode intimidar eleitores que já foram presos ou seus parentes.

Tendências

O último censo populacional americano, de 2010, provocou algumas mudanças na distribuição dos delegados, o que para analistas pode significar uma leve vantagem para os republicanos. "Flórida, Texas e Arizona ganharam delegados. Já a Pensilvânia e Ohio perderam. Estados que tendem a votar nos republicanos, mais ao sul, tiveram esse aumento. Isso ocorre por dois fatores: porque a migração é maior nessas regiões, e também pela taxa de natalidade. Os estados do sul são economicamente mais dinâmicos, houve recentemente uma migração interna", afirma Stuenkel.

Fonte: G1